quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

A Revolução Sandinista e o socialismo democrático



"Socialismo sem liberdade, socialismo não é. Liberdade sem socialismo, liberdade não pode ser."(João Mangabeira)

Sou um homem de esquerda, sou socialista. Mas antes de ser socialista, sou um democrata radical. Portanto assim como sou anti-capitalista, também sou contra aquele modelo autoritario e burocratico de socialismo que existiu na antiga URSS e no Leste Europeu, modelo ainda existente em Cuba e em alguns países da Ásia. Defendo o socialismo com liberdade e democracia.

O modelo ideal de socialismo foi aquele estabelecido pela Revolução Sandinista na Nicarágua, que unindo marxistas e cristãos, derrubou em 1979, a ditadura corrupta e sanguinaria de Anastácio Somoza(ditadura responsável por cerca de 50 mil mortos), implantando um sistema radicalmente democrático e socialista, que em momento algum impediu o funcionamento da oposição burguesa democrática(representada por Violeta Chamarro, viuva do jornalista Pedro Chamorro, assassinado pela ditadura somozista).

Os sandinistas reconheciam que não pode existir socialismo sem democracia, por isso não copiaram o modelo soviético e cubano de partido unico. Também reconheciam que o socialismo não pode ser estabelecido por decreto, motivo pelo qual estabeleceram uma economia mista, onde os setores estratégicos da economia e os bancos foram estatizados, mas a propriedade privada nos demais setores economicos foi respeitada. Foi realizada a reforma agrária e implantado um programa de alfabetização popular. Na verdade, o modelo economico sandinista foi uma reedição da bem sucedida Nova Política Economica, adotada pelos bolcheviques entre 1921 e 1928(que diga-se de passagem, foi o unico acerto dos bolcheviques).

O governo da Junta Provisória liderada pelos sandinistas ficou no poder até 1984, quando ocorreram eleições livres e o líder sandinista Daniel Ortega foi eleito presidente com 67% dos votos. Justamente por representar um socialismo com liberdade e democracia que a Revolução Sandinista foi tão combatida pelo imperialismo yankee, que patrocinaram o exército terrorista dos chamados "CONTRAS", jogando a Nicarágua em uma sangrenta guerra civil, ao mesmo tempo que promoviam um bloqueio economico contra o país.

Cansados da guerra civil, os nicaraguenses votaram em Violeta Chamorro, lider da oposição burguesa democrática, nas eleições presidenciais de 1990, encerrando assim com a Revolução Sandinista.

Mas hoje, os sandinistas voltaram ao poder pelo voto, com o governo do presidente Daniel Ortega, que busca resgatar os valores dessa revolução e assim combater a miséria promovida pelas políticas neo-liberais adotadas no país após 1990.

BBC Brasil - 11 de janeiro, 2007

Daniel Ortega volta ao poder na Nicarágua

Em seu discurso de posse, nesta quarta-feira, o novo presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, afirmou que pretende investir mais em educação e saúde e melhorar as condições de vida dos 80% da população que vivem com menos de US$ 2 por dia.

O novo presidente criticou o "capitalismo selvagem" e disse que as riquezas das políticas neoliberais aplicadas no país até agora chegaram a apenas alguns poucos.

"Temos de abrir um novo caminho que permita às famílias nicaragüenses viver com dignidade", afirmou Ortega depois da cerimônia oficial, em um discurso para mais de 100 mil pessoas em uma praça no centro de Manágua.

O ex-líder guerrilheiro, eleito em novembro como candidato da Frente Sandinista de Libertação Nacional, retoma a presidência depois de 17 anos.

Ortega, de 61 anos, foi um dos líderes da guerrilha sandinista que derrubou o ditador Anastásio Somoza, em 1979, e manteve o poder até 1990, quando foi derrotado nas urnas pela antiga aliada Violeta Chamorro.

Convidados

Alguns dos principais líderes da esquerda da América Latina estiveram presentes à cerimônia de posse, que teve a participação de 16 chefes de Estado.

A pedido de Ortega, a cerimônia oficial começou às 17h25 (22h25 pelo horário de Brasília), mais de uma hora depois do previsto, para esperar a chegada do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que também tomou posse na quarta-feira e logo depois seguiu para Manágua.

Entre os líderes presentes estavam também os presidentes da Bolívia, Evo Morales, do Equador, Rafael Correa, e da Colômbia, Álvaro Uribe.

Os Estados Unidos, antigos inimigos de Ortega - que financiaram os grupos contra-revolucionários dos 'Contras' na sangrenta guerra civil nicaragüense dos anos 1980 -, afirmaram que estão dispostos a trabalhar com o novo presidente caso ele se comprometa com a democracia.

Fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/01/070110_ortegaposse_ac.shtml


A revolução sandinista

*Harold Segura

"A revolução sandinista foi um caso único na História: ela foi ganha, como todas, pelas armas, e se entregou, como nenhuma, por meio de eleições democráticas. Foi bela, assim também como outras, frustrada pelos Estados Unidos, que aplicaram o embargo econômico e apoiaram a luta antiguerrilha que deixou milhares de mortos. De nada serviu que o Tribunal Internacional de Haia condenasse esse país e lhe exigisse o pagamento de 17 milhões de dólares. Nunca os pagou e nunca se retratou".

Com essas palavras o sacerdote e poeta nicaragüense Ernesto Cardenal respondeu a uma das tantas perguntas que lhe foram dirigidas no auditório da Casa Cultural da Embaixada do Chile em São José da Costa Rica e na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade da Costa Rica, em recente visita a esse país.

O padre Cardenal apresentou na ocasião o seu último livro, intitulado "Revolução perdida", publicado pela Editora Centro-Americana Anama.

Com esse título completa-se a obra de três tomos das memórias pessoais do padre Cardenal. "Quisera ter escrito mais, mas não o faço porque tenho péssima memória", disse.

Primeiro veio "Vida perdida", no qual conta seus anos moços e as circunstâncias de sua vocação religiosa. "Meu encontro com Deus era o melhor que tinha para contar. Por isso o escrevi primeiro".

Depois apareceu o segundo tomo: "As línguas estranhas", no qual narra seus anos na Ilha de Solemtiname e a experiência espiritual com um grupo de camponeses ávidos por aprender os segredos do compromisso cristão e da entrega à causa do reino de Deus e sua justiça.

O mais recente, "Revolução perdida", faz um balanço dos anos da revolução e narra com luxo de detalhes a participação do autor na mesma, seja como contato estratégico no exílio, como embaixador internacional na busca da solidariedade dos povos, como guerreiro valente na hora de enfrentar a Guarda, seja como ministro da Cultura depois do triunfo.

Ele traz um testemunho comovente de muitos heróis desconhecidos que entregaram sua vida lutando contra uma ditadura cruel e desapiedada.

"A revolução foi perdida?" Não de todo, responde o poeta, "foi traída por quem fez dela fonte de lucro. Nessa apropriação foram repartidas as terras e se aproveitaram para roubar e se tornarem milionários. Ficou a democracia, embora imperfeita, mas ao fim e ao cabo democracia que era o que não havia quando Somoza governava; também ficou um dos melhores exércitos da América, nascido das entranhas da guerrilha daquele tempo; ficou a arte popular, a poesia, enfim... Isso ficou... o demais foi perdido".

Cardenal, hoje com 79 anos, confirma sua vocação revolucionária, justifica a guerra quando conduz à libertação dos povos oprimidos, aceita a violência quando se dirige contra os opressores, crê que o reino de Deus se constrói aqui na terra e que "toda revolução nos aproxima desse reino, mesmo uma revolução perdida".

É o poeta que continua sonhando e o cristão que continua rezando a Deus "para que se faça sua revolução na terra como no céu".

*Harold Segura: teólogo batista colombiano

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