terça-feira, 22 de janeiro de 2008

A BARBÁRIE STALINISTA

Os comunistas sempre combateram a opressão capitalista, assim como outras formas de opressão, como o racismo e o sexismo. Entretanto ao chegarem ao poder, estabeleceram novas formas de opressão. O stalinismo, por exemplo, acabou degenerando o marxismo-leninismo ao ponto de torna-lo semelhante ao nazi-fascismo em muitos aspectos, demonstrando que extrema-esquerda e extrema-direita são como as duas pontas de uma ferradura: tão distantes e tão próximos ao mesmo tempo.

Durante os 29 anos em que esteve no poder(1924-1953), Josef Stalin foi responsável pela morte de cerca de 20 milhões de soviéticos, incluindo toda a "velha guarda bolchevique", ou seja, os lideres comunistas que haviam realizado a Revolução de 1917, juntamente com Lenin e o próprio Stalin. Com a coletivização forçada no campo, realizada entre 1928 e 1929, o campesinato foi reduzido a condição de servidão. E pior, chegou até mesmo a colaborar com os nazistas, além de planejar perseguir os judeus no começo dos anos 50, perseguição que felizmente não foi adiante em virtude da morte de Stalin.

Felizmente grande parte da esquerda condena o stalinismo, reconhecendo seus crimes. Entretanto os comunistas do PCB, e principalmente os comunistas do PCdoB, insistem em defender Stalin, reconhecendo apenas "erros" e não crimes em sua obra. Afirmam que não são stalinistas e nem anti-stalinistas...

É verdade, pois são mesmo é um bando de hipócritas, que vivem condenando os crimes das ditaduras de direita, ao mesmo tempo que minimizam os crimes hediondos das ditaduras stalinistas. Afinal, desde quando promover a morte de mais de 20 milhões de seres humanos, recolocar o campesinato em um estado de servidão, transformar a URSS em uma ditadura totalitaria, e até mesmo colaborar com a Alemanha nazista, pode ser limitado a simples erros??? Foram crimes hediondos contra a humanidade, tão graves quanto aqueles cometidos pelos regimes nazi-fascistas. E mais, foi uma clara traição a causa socialista.

A COLABORAÇÃO DE STALIN AO NAZISMO

"Em 1931, seguindo a orientação de Stalin, os comunistas alemães se aliaram aos nazistas(antes da ascensão destes ao poder) contra os sociais-democratas, então caracterizados como inimigos principais dos trabalhadores alemães. Isso porque em 1928, Stalin caracterizou a social-democracia como "social-fascismo", igual (ou pior, conforme a ocasião) ao partido nazista; posição reafirmada após a ascensão de Hitler ao poder em janeiro de 1933, quando, em abril do mesmo ano, o dirigente stalinista alemão Fritz Heckert explica aos militantes do Partido Comunista da Alemanha, que "o desabamento do regime fascista na Alemanha depende, antes de tudo, da liquidação da influência da social-democracia reacionária", isso num momento em que Hitler mandava prender os sociais-democratas em massa. Nunca na história uma organização operária havia aceito a destruição de outra organização operária(no caso, do maior partido dos trabalhadores alemães) pela polícia de um estado capitalista repressor, sem se considerar atingida.

Essa política que priorizava a luta contra a social-democracia, acima de tudo, só muda em 1934, com a política de frente popular, que inclui os sociais-democratas numa vasta frente anti-fascista, dirigida também aos partidos burgueses tidos como democráticos."(Vitor Letízia; em "A era do retrocesso: as esquerdas e as guerras no século XX")

Entretanto essa política anti-fascista chega ao fim em 1939, quando é assinado o 'Pacto Germano-Soviético de Não Agressão'. Em agosto de 1939, a URSS assinou um tratado de não agressão com a Alemanha nazista, e nas justificativas desse tratado, apresentada pela Internacional Comunista aos militantes, não há qualquer menção à necessidade de manobrar diplomaticamente para afastar o perigo de uma agressão da Alemanha (o que seria legítimo em tese). Pelo contrário, o Pacto é apresentado simplesmente como política leninista correta. É o que explica Dimitrof, chefe da Internacional Comunista:

"A Alemanha se encontrava no seguinte dilema: rebaixar-se ao nível de auxiliar do imperialismo inglês e francês, fazendo a guerra contra a URSS ou dar uma guinada decisiva e engajar-se no caminho das relações pacíficas com a URSS. Como os fatos demonstram, a Alemanha escolheu o segundo caminho".

E, quanto aos adversários da Alemanha, explica:

"Atualmente os imperialistas ingleses e franceses assumem o papel de adeptos mais fervorosos do prolongamento e da extensão da guerra".

A Segunda Guerra Mundial havia começado em 1 de setembro de 1939, quando a Alemanha invadiu a Polónia. Três dias depois, a Grã Bretanha e a França declararam guerra a Alemanha. E os soviéticos nesse momento estavam aliados a Alemanha nazista, tanto que em 17 de setembro de 1939, a URSS também invadiu a Polónia, jogando uma pá de cal nas esperanças polonesas de resistir a agressão sofrida. Enfrentando o ataque alemão pelo oeste e o ataque soviético pelo leste, a Polónia não teve como se defender e no começo de outubro se rendeu. Alemães e soviéticos partilharam o território polones, com a URSS anexando a parte leste e a Alemanha ficando com todo o resto.

Isso demonstra que a URSS colaborou com o nazismo no início da Segunda Guerra Mundial, além de ter promovido uma política imperialista tão agressiva quanto a promovida pelas forças do Eixo(as forças das potências nazi-fascistas). Tanto que em 30 de novembro de 1939, a URSS invadiu a Finlándia, após esse país não ceder a pressões soviéticas que exigiam importantes partes do território finlandes, assim como também exigiam a formação de um governo pró-Moscou. A guerra durou até março de 1940, com a vitória soviética. Entretanto a heróica resistência finlandesa impediu que os soviéticos conquistassem o país, mas infelizmente foram obrigados a ceder importantes partes de seu território para os vencedores, como por exemplo, a rica região da Carélia.

Em outubro de 1939, a URSS havia invadido as repúblicas bálticas da Lituania, da Letonia, e da Estonia, que eram países independentes desde 1918, estabelecendo regimes pró-Moscou. E em julho de 1940, a URSS anexou essas três repúblicas bálticas, que se transfomaram em repúblicas soviéticas. Também em julho de 1940, a URSS anexou a Moldavia, que pertencia a Romenia.

A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

No dia 22 de junho de 1941, a Alemanha nazista invadiu a URSS, rompendo dessa forma com o pacto de não agressão firmado em agosto de 1939. Então Stalin viu-se obrigado a aderir a guerra contra o nazi-fascismo, encerrando assim com a política de colaboração ao nazi-fascismo que vinha promovendo desde a assinatura do pacto de não agressão.

Entretanto a URSS estava em pessimas condições para travar essa guerra, pois em 1937/38, na época dos Grandes Expurgos, Stalin simplesmente liquidara a elite militar soviética, a quem suspeitara de tentar afastá-lo do poder. Deteve e executou por traição o marechal Mikhail Tukachevski, bem como um número indeterminado de altos oficiais (alguns estima em 33 a 40 mil encarcerados, sendo que inúmeros deles foram fuzilados). O Exército Vermelho praticamente teria ficado acéfalo nas vésperas da Segunda Guerra Mundial por determinação do seu próprio comandante supremo!

"É provável que a dimensão desse violento expurgo se devesse a um acerto de contas de Stalin com Trotsky, visto que foi o seu rival quem forjou o Exército Vermelho durante a guerra civil de 1918-21. O objetivo final seria a stalinização total da organização militar, que até então ficara fora dos expurgos que abateram o partido e a polícia secreta ao longo dos anos trinta." (Fonte: Robert Conquest - O Grande Terror, pag. 478-9)

"A ofensiva alemã sobre o solo russo pegou de surpresa não só o povo soviético, como seu ditador, Joseph Stalin. Todas as evidências de uma vasta concentração de tropas alemães e seus aliados nas fronteiras da URSS haviam sido desconsideradas por ele. Nenhum dos avisos que chegaram ao seu conhecimento pelo serviço de espionagem (o agente Victor Sorge informara, do Japão, a data exata em que se daria a invasão) ou pelas mensagens enviadas pelos ingleses, que também o alertaram, convenceram-no da eminência do ataque de Hitler. Stalin aferrou-se ao pacto de não-agressão germano-soviético de agosto de 1939, também conhecido como Acordo Ribentrop-Molotov, pelo qual ambos os ditadores partilharam a Polônia entre si como acertaram um intercâmbio de produtos entre ambas as potências. A Alemanha se comprometera a fornecer máquinas e equipamentos para a URSS em troca de petróleo, ferro e cereais. E eis que, de repente, Hitler virou a mesa justo quando Stalin confiava nele. O ditador soviético até então entendia as notícias de um ataque hitlerista para breve como resultado das "ações de provocação" espalhadas pelos agentes ingleses para envolver a URSS numa guerra contra a Alemanha nazista. A tal ponto levou esta crença que, quando as primeiras notícias da invasão chegaram ao seu conhecimento no Kremlin, ele ordenou que a artilharia não respondesse ao fogo e que os aviões russos não tentassem sobrevoar território alemão. Quando se deu conta da realidade, teve um colapso psicológico.

Enquanto os alemães e seus aliados avançavam em toda a linha, levando as defensivas soviéticas de roldão, Stalin trancou-se num quarto do Kremlin. Durante onze dias ele negou-se a receber fosse quem fosse. Enquanto isso, a nação, perplexa, estava entregue a si mesma. Os exércitos invasores, aplicando a solta os princípios da Blitzkrig, a guerra relâmpago, cercavam e punham à rendição milhares de soldados russos, levando a crer que a União Soviética teria o mesmo destino dos outros países que caíram logo no controle dos nazistas. Foi neste momento dramático, quando não cessavam de chegar noticias ruins do fronte, que Stalin recuperou-se. A sua alocução galvanizou um país estonteado:

Alocução de Stalin: 3 de julho de 1941

" Esta guerra nos foi imposta, achando-se o nosso país empenhado agora numa luta de vida ou morte contra o mais pérfido e maligno dos seus inimigos, o Fascismo Alemão. Nossas tropas se batem heroicamente em situação desvantajosa, contra um adversário fortemente armado de tanques e aviões... 0 grosso das tropas soviéticas, equipado com milhares de tanques e aviões, somente agora começa a participar dos combates .. Unido ao Exército Vermelho, todo 0 nosso povo se levanta para defender a Pátria.

0 inimigo é cruel e impiedoso. Quer a nossa terra, o nosso trigo e o nosso petróleo. Visa a restauração do poder do latifúndio, ao restabelecimento do Czarismo e a destruição da cultura nacional dos povos da União Soviética quer fazer-nos escravos de principes e barões germânicos.

Nas nossas fileiras não haverá lugar para os fracos e os covardes, para os desertores e causadores de pânico. Nosso povo será destemido na luta e combaterá com abnegação na guerra patriótica de libertação contra os escravizados fascistas.

É preciso que coloquemos imediatamente a nossa produção em pé de guerra e que ponhamos tudo ao serviço da Frente e da preparação da derrota do inimigo. 0 Ex6rcito Vermelho, a Marinha e todo o povo sovi6tico defenderão, polegada a polegada, o solo da nossa Pátria, lutaremos até a ultima gota de sangue em cada cidade e em cada aldeia já... Organizaremos todo o tipo de ajuda ao Ex6rcito Vermelho, faremos com que as suas fileiras sejam constantemente renovadas, dar-lhe~emos tudo quanto precisar. Havemos de conseguir o transporte rápido das tropas, do equipamento e o pronto auxilio aos feridos.


Todas as empresas devem intensificar o seu trabalho e produzir cada vez mais equipamentos, de quantos tipos ....... iniciaremos uma luta sem quartel contra desertores e causadores de pânico..Destruiremos espiões, diversionistas e pára-quedistas inimigos...

Sempre que unidades do Exército vermelho sejam obrigadas a recuar, todo o material rodante ferroviário há de ser também retirado. Ao inimigo não se deixará uma única máquina, ..uma libra de pão ou uma latinha de óleo. Os colcosianos sairá com todos os seus animais, entregarão ao estado suas reservas de cereais para o envio à retaguarda...Tudo o que não puder ser carregado será destruído, seja cereal ou ferro, combustível ou metais não-ferrosos ou qualquer outra propriedade de valor.

Nos território ocupados se hão de formar unidades de guerrilheiros...Haverá grupos diversionistas para combater as unidades inimigas, para difundir por toda a parte a luta de guerrilhas, para dinamitar e destruir as estradas e as pontes, os fios de telégrafo e os dos telefones; para incendiar as florestas, os depósitos do inimigo, os seus comboios na estrada. Nas regiões ocupadas, condições insuportáveis se hão de criar para o inimigo e seus cúmplices, que serão perseguidos e caçados a cada passo..

(...) Um Comitê de Defesa do Estado acaba de ser formado para cuidar da rápida mobilização dos recursos do país; todo o poder e a autoridade do Estado estão nele investidos. Este Comitê já começou a trabalhar e convocou todo o povo a unir-se em torno do partido de Lenin e Stalin e do Governo para o apoio decidido e abnegado ao Exército vermelho e à Marinha para a derrota do inimigo, pela nossa vitória... O imenso poder popular será empregado para esmagar o inimigo. Avante! À vitória!"

A ferocidade da guerra

A guerra germano-soviética ocupou um capítulo aparte na história da Segunda Guerra Mundial, principalmente pela ferocidade com que foi travada e pelo grau inaudito de destruição que provocou. Conforme o conflito foi se estendendo por boa parte da Rússia ocidental e se prolongando por quatro anos, terminou por ganhar dimensões épicas. Stalin tentou inicialmente dar um cunho ideológico ao ataque nazista, querendo entender que se tratava primordialmente de um enfrentamento entre o comunismo e o fascismo europeu. Hitler talvez pensasse o mesmo no começo. Mas o ódio que a ocupação da Rússia despertou entre os seus habitantes e as crescentes atrocidades dos invasores fizeram com que ela descambasse para uma guerra étnico-racial. Logo os comunistas trataram de defini-la como a Grande Guerra Patriótica, procurando com isso atribuir-lhe um cunho nacional-patriótico, chamando para as suas fileiras os nacionalistas e os anticomunistas que ainda sobreviviam no país, para formarem uma poderosa frente de resistência. Não se tratava mais de comunistas contra fascistas, mas do povo russo inteiro contra o que o escritor Ilya Ehremburg chamou de a "praga de gafanhotos", os alemães. E de fato, foi em solo russo que a Alemanha perdeu mais de 70% dos seus efetivos (cerca de três milhões de baixas).

A Vitória Soviética

Depois de terem sido detidos em Leningrado (cercada durante 900 dias) e na frente de Moscou, em dezembro de 1941, duas outras batalhas colossais colocaram fim nas possibilidades de vitória nazista. A primeira delas foi travada na cidade de Stalingrado, à beira do rio Volga, que culminou na rendição do 6º Exército Alemão, comandado pelo marechal Paulus, no dia 1º de fevereiro de 1943, que provocou uma perda de 300 mil homens. A segunda foi a batalha de Kursk, ocorrida no sul da União Soviética e que tornou-se maior batalha de blindados de todos os tempos, quebrando para sempre com a capacidade ofensiva do exercito alemão. Dali em diante, o exército vermelho, ao preço exorbitante de cinco milhões de baixas, tomou a contra-ofensiva em toda a extensão do fronte, até que, finalmente, os marechais soviéticos Zuhkov e Konev entraram numa Berlim completamente destruída, em 2 de maio de 1945, obrigando a Alemanha nazista à rendição final no dia 8 de maio daquele ano mesmo."

(Autor: Voltaire Schilling - professor de História)


Após a vitória na guerra, a URSS deu prosseguimento a sua política imperialista, estabelecendo nos países do Leste Europeu, as chamadas "democracias populares", que logo se transformaram em ditaduras comunistas ao estilo stalinista. O Leste Europeu tornou-se então uma espécie de "quintal da URSS".

O exemplo maior dessa política imperialista da URSS foi a criação da República Democrática Alemã, em 1949, no território alemão que estava sobre a ocupação soviética. A RDA foi uma criação direta da URSS.
Talvez por conta disso, ocorreu na RDA, a demonstração desse imperialismo soviético, quando em 1953, uma manifestação pacifica de trabalhadores em greve, em Berlim Oriental, foi reprimida brutalmente pelo Exército Soviético.

Agora o que acho engraçado é a hipocrisia da esquerda, que vive condenando o imperialismo yankee, mas se esquece de também condenar esse imperialismo promovido pela antiga URSS.


RESENHA: A NOVA FACE DE STALIN

Escrito por Ruy Fausto

Estudos no Brasil e na Inglaterra derrubam mitos sobre a vida e a atuação política do ditador soviético.

A editora Nova Fronteira publica em português a primeira parte (1879-1939) da biografia de Stálin, por Dmitri Volkogonov ("Stálin - Triunfo e Tragédia"), em tradução feita a partir da versão inglesa [a segunda parte também está saindo pela mesma editora]. O autor (1928-1995), general do Exército soviético, filho de um técnico em agricultura que Stálin fuzilou, trabalhou no setor de propaganda do Exército (época em que "adquiriu a reputação de "linha dura'"), foi diretor do Instituto de História Militar do Exército e, mais tarde, assessor do [ex-presidente] Boris Ieltsin e presidente de uma comissão parlamentar que suspendeu o sigilo de milhões de documentos do Partido Comunista da União Soviética.

Dadas as suas funções, pelo menos parcialmente o autor não precisou esperar por essa medida. O livro, publicado em 1989, utiliza materiais a que os biógrafos anteriores não tinham acesso.

Da bibliografia mais recente sobre o tema, é preciso mencionar o livro de Simon Sebag Montefiore - "Stálin - The Court of the Red Tsar" (Stálin - A Corte do Czar Vermelho, ed. Phoenix, editado na Grã Bretanha em 2003). O livro de Montefiore contém uma espécie de análise etnográfica da "corte" de Stálin. Sob muitos aspectos, é o complemento indispensável ao trabalho de Volkogonov.

Gostos literários

Se a crueldade e a amoralidade de Stálin são confirmadas pelos dois autores, eles rompem com a visão, que vem principalmente de Trótski -a de um Stálin "mediocridade burocrática incolor" (Montefiore, pág. 3). Volkogonov reconhece "uma inteligência excepcional" (de modo algum "genialidade"...) por trás do amoralismo "anti-humano" de Stálin.

De qualquer modo, Stálin, autodidata com gostos literários e artísticos os mais tradicionais, era freqüentador assíduo dos teatros e grande leitor, principalmente de literatura e de história. O que não excluía, muito pelo contrário, uma grande hostilidade para com os "intelectuais". Lembremo-nos de que Hitler, que era igualmente um autodidata semiculto, tinha um ressentimento profundo em relação à intelligentsia.

Este primeiro volume nos conta a ascensão de um dirigente de importância secundária à direção suprema do partido e do Estado. A perspectiva de Volkogonov é bastante crítica em relação a Stálin, mas ele idealiza, em alguma medida, a figura de Lênin e o leninismo. Já com relação a Trótski, sem cair na demonização tradicional e reconhecendo alguns méritos ao personagem, a sua crítica parece, apesar de tudo, excessiva ("individualista", "egoísta", "eslavófilo" etc).

Nos textos posteriores de Volkogonov - outros tempos, sem dúvida -, ele critica Lênin e Trótski de forma mais equilibrada.

No que se refere à relação bolchevismo/stalinismo, a perspectiva de Montefiore, cujo livro é extraordinariamente rico, tem o defeito oposto. Ao descrever as práticas dos dirigentes stalinistas, o autor se refere, freqüentemente e sem mais, ao "bolchevismo". A responsabilidade do bolchevismo pelo que aconteceu depois é muito grande, porém importa lembrar que não houve simples continuidade.

Nos dois livros, mostra-se bem que a responsabilidade pelos crimes não é só de Stálin mas também da sua equipe de colaboradores. Os grandes co-responsáveis se chamam Molotóv, Vorochilóv - uma figura particularmente repugnante pelo amoralismo e a mediocridade, embora fosse fisicamente corajoso - e Kaganovitch.

Também Béria - um sádico de rara crueldade - e Zdanóv. Além de Malenkóv, os dois livros revelam quanta culpa no cartório tinha, igualmente, Kruschev, que, após a morte de Stálin, lançaria a luta contra "o culto da personalidade".

A história da emergência do grande terror stalinista é contada em registro mais político por Volkogonov e, mais "etnográfico", por Montefiore. É preciso ler os dois textos para ter uma idéia completa dessa novela de horror. Bem entendido, antes do grande terror - refiro-me à liquidação irracional e "compulsiva" de quadros do partido e da sociedade civil que se dá a partir de 1934 -, já tinha havido muita violência. E o genocídio dos camponeses ocorrido no início dos anos 30 ultrapassa de longe o número de vítimas imediatas do terror.

Grande terror

Porém a maneira pela qual Stálin liqüida os seus companheiros de partido durante o grande terror é, se ouso dizer, notável -um verdadeiro clássico da brutalidade e da abjeção. A história de Kamenev e Zinoviev, antigos companheiros de direção, é particularmente atroz. Kamenev e Zinoviev já tinham capitulado de um modo humilhante nos anos 20, mas só são processados nos anos 30. Stálin lhes informa que, se se dispuserem a confessar todos os "crimes" (trata-se das acusações mais estapafúrdias, de traição e conspiração), o Bureau Político - mas do Bureau político só aparecerão Stálin e mais dois - lhes garantirá a vida.

Como era de esperar, eles confessam tudo e são condenados à morte. No dia da execução, Zinoviev - Kamenev tem uma atitude mais firme - pede aos guardas, desesperada e inutilmente, para falar com Stálin. Semanas depois, num jantar comemorativo, um dos personagens da corte de Stálin, que fazia freqüentemente o papel de bufão, imita as últimas palavras de Zinoviev (o artista usa sotaque ídiche: Zinoviev -como o próprio bufão, que, mais tarde, também seria executado - era judeu). Stálin e os demais convivas riem a não poder mais.

Dentre os muitos problemas teóricos e históricos que a leitura de uma biografia de Stálin levanta, destaco três (só proponho algumas hipóteses, evidentemente). Um é o da natureza do regime stalinista. O segundo é o de por que a opinião mundial de esquerda se iludiu, em proporção impressionante, com a figura de Stálin e com a natureza do seu regime.

O terceiro problema, mais específico, é o das razões do terror. A primeira questão, que já discuti em outros lugares (permito-me remeter a um texto recente sobre Trótski que publiquei na revista "Lua Nova"), poderia ser resumida pelos dois termos que utilizei no título do presente artigo. Stálin foi em geral considerado pela crítica (de esquerda, em particular) como um burocrata. Mas ele aparece também - ou antes? - como um déspota (Castoriadis considerava uma tolice a afirmação de Trótski de que Stálin é a quintessência da burocracia; uma atitude crítica que vai na mesma direção, embora menos radical, se encontra, também, no historiador Moshe Lewin).

Na realidade, Stálin foi as duas coisas. E mais: a reunião desses dois "estilos" numa só pessoa é um sintoma da originalidade do "sistema stalinista" (observe-se que também no nazismo há despotismo - ou tirania, não discuto aqui a nuança - e burocracia. Porém, se Hitler foi um déspota, ele não foi, como Stálin, um burocrata).

Para a segunda questão, diria, que embora essa não seja a única razão, seria importante ressaltar que a doutrina hegemônica no interior da esquerda desde o final do século XIX, o marxismo, estava mal preparada para pensar a emergência de um "tertius" entre o capitalismo e o socialismo (em última análise, porque apesar de todas as suas inovações, o marxismo dependia demais da filosofia do progresso) e mal preparada, em especial, para decifrar um "tertius" que se apresentava sob a forma de um despotismo. Como já disse em outro lugar, "despotismo" não é um verdadeiro conceito no discurso de Marx. Sobre a questão dos motivos do terror, tenho a impressão de que havia ali pelo menos dois elementos.

De um lado, como os dois autores observam, havia o aspecto que poderíamos chamar de "queima de arquivo". Stálin queria liqüidar aqueles que sabiam demais e que sabiam principalmente duas coisas: que o papel histórico de Stálin havia sido bastante secundário, e outra, mais grave, que no seu famoso "Testamento", Lênin tinha proposto o afastamento dele, Stálin, do Secretariado Geral, por ser excessivamente rude, pouco leal, etc.

A liqüidação desses "arquivos" apareceu como uma necessidade a partir do 17º Congresso do Partido (1934), porque, para surpresa geral, na eleição para o Comitê Central, houve mais de 300 votos contra Stálin - com o agravante de que só houve três votos contra Kirov, o dirigente que seria assassinado pouco mais tarde, em circunstâncias misteriosas (que a votação tenha sido secreta e que a eleição de Stálin não estivesse ameaçada não protegeu os opositores. Stálin liqüidou em massa os participantes desse congresso). Havia assim um descontentamento surdo contra Stálin.

Mas, além disso, e sem falar na "inércia" de todo terror, para além do objetivo de eliminar testemunhas, Stálin deve ter visto o interesse que oferecia o terror. Provavelmente, ele se deu conta de que o despotismo não sobrevive sem um terror cíclico.


Ruy Fausto é filósofo, professor emérito da USP e leciona na Universidade de Paris 8. É autor de, entre outros livros, "Marx -Lógica e Política" (ed. 34) e "Dialética Marxista, Dialética Hegeliana" (ed. Paz e Terra).


Stálin (volume 1, 1879-1939),416 págs., R$ 39,00de Dmitri Volkogonov. Trad. Joubert de Oliveira Brízida. Nova Fronteira (r. Bambina, 25, CEP 22251-050, RJ, tel. 0/xx/21/ 2131-1111).

Stálin (volume 2, 1939-1953),312 págs., R$ 39,00de D. Volkogonov. Trad. Joubert de Oliveira Brízida. Nova Fronteira.

Stalin - The Court of the Red Tsar, 816 págs., US$ 30de Simon Sebag Montefiore. Ed. Knopf (EUA)


MORTE DE STALIN

"Prendam os Médicos Assassinos" - alardeava a manchete do Pravda a 13 de janeiro de 1953. "Os médicos do Kremlim, judeus em sua maioria, assassinaram os maiores líderes soviéticos, e tramaram contra outros, talvez até contra o próprio Stalin" - dizia o artigo.

Um editorial na primeira página, intitulado "Espiões miseráveis e assassinos sob a máscara de doutores", dizia: "Agentes de segurança do governo desmascararam médicos terroristas que assassinaram figuras públicas soviéticas através de tratamento médico. Os acusados, Professores Vovsi, Vinogradov, Yegorov, Feldman, Etinger, Grinshtein, Mayorov, Kogan e Kogan, pertenciam à associação burguesa judaica internacional nacionalista 'Joint', a organização sionista de espionagem... Dr. Vovsi confessou que recebera ordens de 'eliminar a liderança da URSS'. Provas documentais, investigações e as confissões dos presos estabeleceram que os criminosos sabotaram seus pacientes e ministraram-lhes um tratamento inadequado.

"Estes monstros tripudiaram sobre o sagrado estandarte da medicina. Esta quadrilha de animais em forma de gente planejou eliminar os líderes das forças armadas e enfraquecer as defesas da Rússia. Todo o povo russo deve intensificar sua vigilância. Estejam de prontidão para todas as manifestações dos fomentadores de guerra e seus agentes."

Espancamento e tortura

Os médicos foram presos e torturados para confessarem seus "crimes."

O historiador russo Anton Antonov Ovseyenko relatou: "O neuro-patologista Grinshtein comportou-se bravamente. Grinshtein, um homem forte, foi torturado com choque elétrico, selvagemente espancado, e seu rosto mutilado. Foi cruelmente condenado a passar fome, perdendo 63 dos seus 100 quilos originais. (Mais tarde, quando foi libertado, não conseguia andar, e teve de subir as escadas de sua casa usando as mãos e os pés.)

Amplamente divulgada, a 'conspiração dos médicos' de Stalin desencadeou uma histeria anti-semítica para distrair o populacho de outros problemas sociais. As ceifadeiras maléficas tinham conseguido uma farta colheita.

Histeria em massa

Por seis semanas, a história dos traidores médicos judeus proliferou por toda a sociedade soviética. Trud, um jornal trabalhista popular, advertiu que "a justiça soviética esmagará como a uma serpente venenosa o bando de criminosos que se vendeu por um punhado de dólares e libras esterlinas."

A Gazeta Literaturnaya desvendou uma "célula subversiva" no Conselho de Instrução da Biblioteca do Instituto de Moscou dirigido por "Abramov, Levin, Fried e Eikenvolts."

A capa da revista Krokodil estampava a caricatura de um médico sedento de sangue e dólares, cuja máscara era arrancada pela Mão da Justiça para revelar um perverso judeu. "Os médicos são a personificação da baixeza e abominação, como Judas Iscariotes."

As histórias correntes desencadearam uma caça às bruxas contra "os espiões e envenenadores sionistas". Todos os médicos, enfermeiros ou farmacêuticos judeus ficaram vulneráveis. Em Tashkent, um médico judeu foi acusado de tentar matar um bebê. As pessoas acreditavam que os médicos judeus injetavam agentes causadores de câncer ou de sífilis nos pacientes. Espalhou-se uma história de que um médico judeu havia transformado um menino em um cão.

Na Ucrânia, vinte médicos presos em Zhitomir foram chamados de "assassinos de crianças". Todos os Kogan, Yaroshetski, Grinshtein e Kaplan despertavam profunda ira e repulsa nas pessoas.

Duas centenas de judeus foram desligados da Universidade de Odessa, e todos os bacharéis da Escola de Medicina foram enviados para áreas remotas de Camchatca e Yacutia, na Sibéria. Perguntaram ao chefe do Departamento de Engenharia de uma grande empresa estatal: "Está informado a respeito dos médicos. Agora diga-me: podemos confiar em vocês? Aconselho-o a pedir demissão."

Raisa Palatnik, então estudante, lembrou: "Eu tinha medo de ir até o corredor da escola. Escutava de todos os lados:' Vocês, judeus, envenenaram Gorki; agora desejam envenenar Stalin!'"

Em outros países

Os jornais diários de Pequim estampavam as notícias nas primeiras páginas, proclamando o fato como "uma vitória na luta conjunta de todos os povos socialistas contra a agressão americana". Os chineses não tinham judeus para jogar na prisão, mas a KGB enviou seus agentes para prender o médico judeu soviético de Mao Tsé Tung.

Os regimes comunistas do Leste Europeu interrogaram os líderes de suas próprias e minúsculas comunidades judaicas que haviam sobrevivido ao Holocausto. A 15 de janeiro, quatro líderes judeus da Alemanha Oriental fugiram para Berlim Ocidental após intensa interrogação por agentes de segurança do governo, e a polícia secreta atacou as casas de 2000 judeus em Berlim Oriental.

Em Israel

No Parlamento Israelense, o Ministro do Exterior, Moshe Sharet, denunciou a calúnia, e todos os partidos se uniram para condenar o anti-semitismo soviético. Porém, os comunistas israelenses acreditaram na culpa dos médicos, com Mapam criticando o governo israelense por "alimentar o assunto, visando à propaganda política."

A 9 de fevereiro, uma explosão dentro da Embaixada Soviética sacudiu o centro de Tel Aviv, e três soviéticos ficaram feridos. Três dias após a explosão, a Rússia cortou relações diplomáticas com Israel. O Ministro do Exterior. Andrei Vyshinsky. convocou o enviado israelense e entregou-lhe uma nota. rejeitando as desculpas de Israel. A quebra de relações foi aproveitada pela imprensa soviética. Golda Meir chamou-o "um dia negro para Israel, para o judaísmo mundial e para os judeus soviéticos. Sofro por eles em meu coração."

Enquanto isso, no Brooklyn...

No inverno de 1953, a 21 de Tevêt, cinco dias antes da "Conspiração dos Médicos," o Rebe inesperadamente ordenou a publicação de um discurso chassídico especial intitulado "En Hacadosh Baruch Hu Ba Bitrunya" ("D'us não sobrecarrega Seu povo"). A ocasião não parecia apropriada. Discursos como esse normalmente eram publicados apenas em homenagem a festividades especiais. Ninguém entendeu por que o Rebe desejava que o folheto fosse publicado, mas é claro que foi feita sua vontade.

Uma citação do discurso (traduzida livremente) pode lançar alguma luz sobre o assunto: "... Às vezes o cumprimento de Torá e mitsvot torna-se um desafio, pois devemos encarar os zombadores que ridicularizam aqueles que temem a D'us e que estudam Torá. Esta é a chutspá do tempo que precede Mashiach. Mesmo assim, D'us nos dá apenas o fardo que podemos carregar. O nosso é um exílio amargo, porém temos dentro de nós a força para suportá-lo..."

Todos acreditavam que o Rebe explicaria este novo discurso em um farbrenguen, mas ele não o mencionou, tornando-o um mistério entre os chassidim.

O último "hurra"

Aqueles reunidos no farbrenguen de Purim do Rebe em 1953 tentavam se alegrar, mas todos estavam preocupados com a terrível ameaça que pairava sobre os judeus russos. As pessoas cantavam e diziam lechayim como de costume. Mas enquanto o farbrenguen continuava até as primeiras horas da manhã, o Rebe subitamente ficou muito sério. Falando sobre a situação política na Rússia, contou a seguinte história:

"Depois que o czar foi deposto, o Rebe Rashab (Quinto Rebe de Chabad) disse a seus seguidores que participassem das eleições que seriam feitas. Havia um chassid devotado que estava afastado de assuntos mundanos e nada sabia sobre política. Mas inspirado pela oportunidade de cumprir a vontade do Rebe, o chassid se preparou espiritualmente: foi ao micvê para se purificar, vestiu seu gartel e dirigiu-se à cabine de votantes. Não sabendo o que fazer, apenas imitou o que as outras pessoas faziam. Após votar, ouviu pessoas exclamando: 'Hurra!' Então gritou também: 'Hu-rá! Hu-rá!' [Em hebraico, as palavras significam: 'Ele é mau.']"

Pegando a deixa das palavras do Rebe, os chassidim ergueram-se e, em uníssono, exclamaram com entusiasmo: "Hu-rá! Hu-rá! Hu-rá!" Três vezes durante o farbrenguen (um fato sem precedentes) o Rebe fez discursos sobre a erradicação de Amalêk. Dois dias depois, a 4 de março, os russos anunciaram oficialmente que Stalin estava seriamente enfermo e que perdera a consciência. No dia seguinte, a verdade foi anunciada: Stalin estava morto.

Mesmo quando os judeus russos continuaram a olhar o futuro com ansiedade, podiam respirar aliviados por enquanto. "Os judeus sentiram júbilo, alegria e luz," como na Meguilá. A miraculosa reviravolta nos eventos deu um final feliz à "Conspiração dos Médicos". Os médicos foram libertados, a propaganda odiosa terminara e o cruel reinado de terror de Stalin chegara a seu fim.

Uma outra publicação especial

Vários dias mais tarde, a 18 de Adar, embora não fosse nenhuma data especial no calendário judaico, o Rebe ordenou a publicação de um novo discurso. Na introdução, o Rebe escreveu: "Este folheto está sendo publicado em resposta a um "pedido." Quem pediu? Somente o Rebe sabia.

Este discurso especial trata da singularidade de Israel entre as nações, e inclui esta perspectiva no poder e na influência dos tsadikim (justos) para afetar os perversos: "No Shabat Vaerá de 1917, o Rebe Rashab pronunciou um discurso sobre o versículo: 'D'us falou a Moshê: Fiz de ti um amo sobre o faraó' e Rashi comenta: 'Um amo para punir e para disciplinar.' D'us deu a Moshê esta força milagrosa para derrotar o faraó, mesmo do alto de seu poder... O governo czarista caiu várias semanas depois."

Retornando à história...Forçados a assinar uma declaração

Judeus soviéticos proeminentes receberam ordens de assinar "A Declaração Judaica" - a ser publicada no Pravda após um breve julgamento e execução pública na Praça Vermelha. A declaração pedia a deportação de judeus para campos de concentração na Sibéria.

A declaração afirmava: "Apelamos ao governo da União Soviética, e ao camarada Stalin pessoalmente, para que salvem a população judia da possível violência na onda de revelações sobre os médicos envenenadores e o envolvimento dos renegados cidadãos soviéticos de origem judaica, que foram apanhados em flagrante num complô sionista-americano para desestabilizar o governo soviético.

"Juntamo-nos a todos os povos soviéticos ao aplaudir a punição dos médicos assassinos, cujos crimes exigem as medidas mais severas. O povo soviético está ultrajado pela crescente onda de traição e deslealdade. Para nossa consternação, muitos judeus têm auxiliado nossos inimigos a formarem uma quinta coluna em nosso meio. Cidadãos mal orientados podem ser levados a reagir indiscriminadamente contra os judeus.

"Imploramos que proteja os judeus, despachando-os para o oriente, para trabalharem em empregos úteis e escaparem à compreensível fúria suscitada pelos médicos traidores.

"Como figuras de destaque entre os judeus soviéticos leais, rejeitamos totalmente a propaganda sionista-americana sobre o anti-semitismo na União Soviética. É apenas uma cortina de fumaça para disfarçar a tentativa frustrada de assassinar os líderes soviéticos e desviar as críticas sobre o anti-semitismo americano no caso Rosenberg e as intenções genocidas dos americanos contra a população negra dos Estados Unidos. Na União Soviética, em contraste, o racismo é proibido pela constituição e totalmente inexistente."

A reação judaica

Em fevereiro, Stalin enviou judeus soviéticos proeminentes, incluindo a família do autor teatral assassinado, Solomon Michoels, ao Cazaquistão, como pioneiros da planejada deportação em massa. Muitos judeus cometeram suicídio, antecipando o que estava para acontecer.

O terror engolfou até os judeus sefarditas da Geórgia, onde a incidência de anti-semitismo era menor que em qualquer outra parte da Rússia. Todas as sinagogas da Geórgia guardaram seus Rolos de Torá em esconderijos. Os oficiais do governo em Cutaisi levaram dinamite a três sinagogas para explodi-las. Os judeus lhes disseram: "Terão que nos explodir junto com a sinagoga." Os oficiais afastaram-se, pensando que poderiam esperar umas poucas semanas até que os judeus fossem deportados.

O plano de deportação de Stalin

O plano de Stalin exigia que os médicos fossem considerados culpados e condenados à morte no final de março ou começo de abril. Seriam enforcados na Praça Vermelha sobre o mesto de Lobnoye, uma plataforma redonda de pedra, próximo ao Kremlim, usada para execuções na época medieval.

Os ataques aos judeus seriam comandados pela polícia secreta. A declaração feita pelos judeus proeminentes seria publicada, e o povo exigiria ação. Os judeus seriam deportados para acampamentos a leste dos Urais. Os líderes judeus de todos os níveis seriam designados como espiões uns dos outros. A KGB começaria matando a elite judaica, assim como haviam assassinado os escritores judeus em agosto do ano anterior. Então o palco estaria armado para "livrar-se do resto" em campos de trabalho gulag, e finalmente o "problema judeu" desapareceria pelo desgaste.

Stalin insistiu para que os oficiais do partido começassem logo os pogroms. Disse a Krushkhev: "Os operários devem receber bastões para espancar os judeus."

Barracões especiais foram construídos. Anos depois, um engenheiro judeu da marinha soviética na Sibéria viu uma imensa cidade fantasma esparramada, com barracões de madeira semi-destruídos cobrindo uma área de pelo menos dois quilômetros quadrados com fileira após fileira de barracões: "Era uma vastidão de tirar o fôlego." A área estava pintalgada com centenas de campos de concentração soviéticos.

O ataque da imprensa aos "médicos estrangeiros" e à "matilha de cães de Tel Aviv" causou uma comoção febril, e o Teatro de Marionetes de Moscou apresentava bonequinhos grotescos com feias caricaturas de judeus.

A reação dos Estados Unidos

A 12 de fevereiro, quarenta e nove americanos proeminentes, incluindo a Sra. Eleanor Roosevelt, Sumner Welles, General Taylor e Lewis Mumford, apelaram ao Presidente Eisenhower para que falasse em nome dos milhões de judeus que enfrentavam "uma epidemia de pogroms, ataques inspirados pelos comunistas", pedindo-lhe que emitisse uma "condenação solene, e advertisse que este ataque contra o povo judeu era um convite ao massacre".

A 16 de fevereiro, o Senador Hendrickson apresentou uma Resolução do Congresso que comparava o anti-semitismo comunista às práticas fascistas e nazistas. Porém, organizações fascistas americanas e publicações macartistas como Bom Senso e Renascença Nacional elogiaram os soviéticos por investirem contra a ameaça judaica.

A morte de Stalin

A "Trama dos Médicos" cessou bruscamente a 1º de março, quando, pela primeira vez desde 13 de janeiro, o Pravda não se manifestou sobre os médicos envenenadores.

A filha de Stalin, Svetlana Alliluyeva, soube da situação do pai no dia 2 de março. Stalin jazia no sofá, sufocando-se lentamente, enquanto a hemorragia em seu cérebro espalhava-se para o resto do corpo. Seu rosto escureceu e os lábios tornaram-se negros. De repente, para pavor de todos, levantou a mão esquerda e apontou para os que o assistiam, como que amaldiçoando-os. Sua face tornou-se irreconhecível, enquanto literalmente sufocava até a morte.

A data da morte de Stalin, 2 de março, coincidiu com Purim daquele ano: domingo e segunda, 1º e 2 de março de 1953.

Choro e soluços

Os judeus soviéticos tinham razão para celebrar, mas dentre os milhões que prantearam Stalin havia também muitos judeus. Ida Milgrom, a mãe de Natan Scharansky, chorava incontrolavelmente - não por Stalin, mas porque temia que os judeus recebessem a culpa, e ela esperava os mais severos pogroms. Na praça da cidade de Stalin, ela ficou horrorizada ao ver um homem estapear a face de uma judia idosa. "Seus miseráveis" - gritou ele - "mataram nosso Stalin e agora estão chorando?"

Fonte: http://www.chabad.org.br/biblioteca/historias/hist50.html

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